caricatura de Miguel Soares
Para além da qualidade da sua obra, que o torna indiscutivelmente num dos maiores escritores portugueses contemporâneos e num dos grandes a nível mundial, retenho de António Lobo Antunes, a sua irascibilidade, o seu ar de permanente má disposição, como se estivesse de mal com o mundo por querer abraçar toda a gente e não conseguir fazê-lo a ninguém, e desta coisa deliciosa que se dá pelo nome de «Bolero do Coronel Sensível que fez amor em Monsanto», do qual só há relativamente pouco tempo tomei conhecimento, estando longe de imaginar, com esta lacuna minha, das incursões de Lobo Antunes por estes tão reconfortantes territórios.
Bolero do Coronel Sensível que fez amor em Monsanto
Eu que me comovo
Por tudo e por nada
Deixei-te parada
Na berma da estrada
Usei o teu corpo
Paguei o teu preço
Esqueci o teu nome
Limpei-me com o lenço
Olhei-te a cintura
De pé no alcatrão
Levantei-te as saias
Deitei-te no banco
Num bosque de faias
De mala na mão
Nem sequer falaste
Nem sequer beijaste
Nem sequer gemeste,
Mordeste, abraçaste
Quinhentos escudos
Foi o que disseste
Tinhas quinze anos
Dezasseis, dezassete
Cheiravas a mato
À sopa dos pobres
A infância sem quarto
A suor, a chiclete
Saíste do carro
Alisando a blusa
Espiei da janela
Rosto de aguarela
Coxa em semifusa
Soltei o travão
Voltei para casa
De chaves na mão
Sobrancelha em asa
Disse: fiz serão
Ao filho e à mulher
Repeti a fruta
Acabei a ceia
Larguei o talher
Estendi-me na cama
De ouvido à escuta
E perna cruzada
Que de olhos em chama
Só tinha na ideia
Teu corpo parado
Na berma da estrada
Eu que me comovo
Por tudo e por nada
(Lobo Antunes)
De ruben a 25 de Agosto de 2007
gosto particularmente deste poema de Lobo Antunes , só que os coroneis sensíveis não vão fazer amor ao monsanto; é, isso é pura ingenuidade dele. os nossos heróis vão fazer amor ao elefante branco juntamente com a classe politica dirigente , a magistratura e a alta burguesia, etc, etc, etc. tenho pena mas é verdade, eu já lá os vi!!!!!!!!!!
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